quarta-feira, 26 de novembro de 2014

"Plastiquismos" à parte

     Se houve algo que sempre me inquietou o espírito durante a minha estadia e trabalho em Itália foi, sem dúvida alguma, o desperdício de plástico generalizado em cantinas e serviços de refeição destinados a crianças e staff nas escolas e centros de educação e de infância, em geral. Pelas aclamadas regras de higiene e cuidado com a saúde pública, redução do risco de transmissão de infecções e afins, pratos e pratos e talheres e copos de plástico eram, todos os dias, despejados em contentores do lixo. Com a "pequena" agravante de que, em Savona, se o plástico estiver "sujo" não poderá ser reciclado (...) e, portanto, segue para o lixo comum. E como em Itália a organização da comida é diferente da nossa, não me refiro a um prato por aluno, por refeição, mas sim a dois pratos - Primo piato + Secondo e contorno - por aluno. Imaginem a quantidade diária de plástico que é deitado no lixo, directamente, sem grande divisão. 

     É precisamente com este pensamento em mente que observo todos os dias, aqui na casa, como as crianças se dirigem, um por um, até à bomba de água com o seu prato de metal na mão, antes de comer e depois de comer, lavando-o para aquela utilização. Existem alguns pratos a mais, para as visitas, mas não existe nenhuma refeição em que um prato fique por lavar. Assim que terminam de comer, arrancam a todo o gás para a bomba de água, lavando-o e colocando-o, depois, no lugar. Isto trouxe-me meia memória de infância - é claro que já nasci no tempo europeu em que nos davam a loiça já lavada, nas grandes cantinas do infantário, mas - lembro-me de comer a sopa também em malgas de metal, e de beber o leite, ao lanche, em canecas de plástico-estilo-pic-nic-daquele-rígido-que-se-pode-lavar-e-reutilizar. Não me lembro de alguma vez o médico ter dito aos meus pais que no tratamento a um qualquer diagnóstico de gripe eles tivessem de enviar o meu prato pessoal para o infantário ou para a escola. Na verdade, acredito que isto possa efectivamente melhorar as defesas das crianças a longo curso, ajudando à criação de anticorpos. Não me alongarei nesta discussão de saúde pública nem irei, sequer, entrar no discurso ambiental, em que a escolha plasticária feita em Itália (e talvez também já seja assim nas escolas portuguesas; perdi essa evolução, confesso) pode implicar. 

     Por outro lado, esta ideia de que cada um limpa o seu prato e o arruma, introduz um outro reparo que gostava de fazer - a noção de arrumação e limpeza que estas crianças têm. Eles são mais ou menos uns trinta a viver todos na mesma casa, desde pequeninos a maiores de idade, mas todos, sem excepção, arrumam os seus quartos! É claro que os mais pequenos precisam de um "lembrete" ou incentivo, mas nos mais velhos esta noção já está interiorizada - de manhã, uma das actividades realizadas naquelas horas extra que o levantar às 5h lhes dá é, precisamente, a dança da vassoura. Sobe-se as escadas e salta-se o último degrau, onde já anda uma das mais velhas a varrer freneticamente. Nos dias em que se activa um dos pequenotes, activam-se todos: é ver uns de vassoura na mão pelo chão, outros em equipa que passam a roupa seca da cama para o cabide, o outro que arruma os livros e a mais velha que alinha as tropas do quarto em frente. Ninguém "respinga" muito, fazem-no meio em brincadeira, ainda de sorriso em face! O cuidado com a roupa é também feito por cada um, logo que se cresce um bocado e já não se tem sete anos, mais ou menos. A partir desta idade cada um toma conta da sua roupa, lavam-na, estendem e arrumam numa organização que só eles entendem. O "armário" é um cabide em madeira dividido entre os quatro ou seis que dividem o mesmo quarto também e, no meio de calças, camisolas, camisas, saias e t-shirts, eles lá se entendem sobre a quem pertence o quê, sendo raro ver roupa pelo chão ou espalhada no quarto dos mais velhos. Estou segura de que se a minha mãe visse os quartos deles de manhã (ou especialmente ao Sábado - dia de limpeza geral, já que a empregada não está) ia simplesmente dizer-me: «- Devias ter vergonha do teu quarto, Vanessa! Segue só este exemplo..» E eu dar-lhe-ia toda a razão. 

     Estas observações mostram-me e confirmam-me o quão importante é responsabilizar as crianças desde novas. O quão importante é mostrar às crianças que o que temos deve ser cuidado, é nosso, deve ser atentamente tratado e que nem sempre temos a mãe, o pai, a empregada, a avó ou quem seja ali para nos "servir". E, mais uma vez, contra mim falo, mas é também disto que a vida é feita - auto consciencializar de forma a melhorar, a reconhecer, a crescer. . Tikapur está a entrar-me dentro, passando o pleonasmo.

Obrigada. 

Bom apetite, pessoas!

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